Eu estava assistindo a Maratona na casa de um amigo meu e nos momentos finais o queniano que faturou a prova estava sozinho na frente sem concorrência ameaçadora. Olhando pela tv tem-se a impressão errônea de que êle está contando os metros e os minutos para acabar olhando para a paisagem e reconhecendo o local onde se encontra. Na verdade está muito concentrado, bem mais do que as pessôas possam pensar. O cansaço extremo no final de uma prova dessas é um desafio psicológico e não apenas físico.
Num dado momento apareceu na tv a velocidade em que êle corria – 18 km/k. Comentei com o meu amigo que naquele momento depois de ter corrido 40 km êle estava correndo mais rápido do que eu nos meus treinos. Claro, êle além de jovem é profissional e está relizando um esfôrço físico à altura das duas capacidades, embora não seja nada fácil mesmo para alguém com o treinamento dêle.
Mas, afinal quanto corre um cara dêsses? Aquilo que pela tv parece algo normal, que grau de dificuldade e performance tem?
Em 1995 eu fiz a única São Silvestre da minha vida. Digo única e me arrependo muito de ter sido apenas essa, pois no ano seguinte a neurose do trabalho estressante tomou conta e venceu a minha motivação de cair cedinho da cama, pôr o tênis e fazer outro treino.
Naquela época a minha velocidade em um treino que variava entre 10 e 18 km de percurso, era de aproximadamente 12 km/h. Nunca corri mais veloz que isso simplesmente porque nunca trenei com essa meta. Se tivesse me ocupado em melhorar a minha velocidade teria conseguido.
Naquele ano em que fiz a São Silvestre havia 3 pelotões. Na frente os que vão disputar o pódium, onde está o coelho que é um profissional que dita o ritmo no início da prova servindo de referência. O segundo pelotão são atletas convidados e o terceiro o que eu chamaria de “sem tênis”, o povão que vai lá sem qualificação técnica para chegar na frente, e em certos casos até para terminar. Ali estávamos eu, o Maurício Gouveia e mais 12000 malucos que pensam que são só 15 km.
Na largada eu estava a mais ou menos um 100 metros atrás da ponta do meu pelotão. Quando a corneta é acionada demora um pouquinho até que o bôlo se abra e comece a surgir caminho livre na frente. A largada é em frente ao prédio da Gazeta. Pouco depois disso entra-se na Consolação à direita, o primeiro trecho em descida.
Para a minha surprêsa quando eu entrei na Consolação o ponteiro já tinha virado à esquerda lá embaixo. Um foguete comparado comigo. Aí eu descobri o quanto corre um atleta dêsses. Até dei risada daquilo que via, que me pareceu até bizarro.
Mas como era só o início da prova me restava apenas aquecer os múculos nos primeiros minutos e estabelecer o ritmo. Mas eu sabia que lá no final tinha a Brigadeiro e precisava poupar um pouco no comêço. Eu dosei o ritmo um pouco mais lento do que deveria e passei embaixo dos chuveirões que encontrava no meio do caminho. É um bom refresco.
Mas aí finalmente cheguei na Brigadeiro. Até hoje eu subiria a dita avenida a pé sem maiores desconfortos. Mas naquêle dia eu dobrei a esquina e o que eu vi me fez pensar no que estava fazendo ali. O cansaço te influencia psicológicamente. Eu não vi a Brigadeiro mas algo parecido com o Himalaia. A subida ficou comprida e alta, não era mais a Brigadeiro que eu conhecia.
Vi muita gente mal preparada subir a avenida andando ou parando no meio do caminho. Coisa de amador. Eu diminuí o ritmo e usei as fôrças que tinha conservado anteriormente e continuei correndo. Mas olhando para o chão pois a subida parecia não acabar mais. Me lembro de que um pouco antes da entrada na Brigadeiro eu ouvi não sei onde que a prova já tinha sido encerrada. E eu ainda tinha mais 3 kilometros a percorrer.
Lá no final eu olhei para frente e vi que o platô se aproximava e senti um alívio pois restaria apenas chegar na Gazeta. Para o meu contentamento a corrida não termina na Gazeta e sim bem antes. Entrei na Paulista e vi ali na frente aquêle imenso portal da chegada (para mim ficou imenso naquela hora), marcando o tempo de prova. Cruzei a linha de chegada, ganhei uma medalha de participação e fiquei satisfeito com o sentimento do dever cumprido e com a certeza de que quenianos correm uma barbaridade, muito mais do que imaginava. Descobri nesse dia quanto.
Há poucos dias eu fui conferir se ainda tenho condições de treinar de nôvo. Dá, mas vai ser muito sacrificado se eu quizer levar em frente. Gostaria de ter condições de fazer essa prova tôdo ano. Vamos ver.
O sono, a alimentação, a atividade física regular e, até o lazer são importantes para que se garanta bons resultados.
Mas antes de tudo, muita força de vontade e disciplina…Parabens pela boa forma!